Conflito entre a Lei Maria da Penha e a alteração trazida no art. 311 do CPP, pelo Pacote Anticrime
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Conflito entre a Lei Maria da Penha e a alteração trazida no art. 311 do CPP, pelo Pacote Anticrime

Lei 11.340/2006. Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.

CPP. Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

“Devemos observar dois diplomas normativos que serão devidamente analisados, cabendo elegê-los qual dos dois o melhor se amolda.

Primeiro, diz respeito ao artigo 20 da Lei Maria da Penha (Lei n.11.340/06)[1] que permite a prisão preventiva em face do agressor de ofício pelo juiz, ou seja, sem a necessidade de provocação do referido julgador.

O Segundo diploma processual está relacionado quanto à impossibilidade de decretação de prisão preventiva de ofício pelo juiz, com o advento do Pacote Anticrime (Lei 13.964/19), que alterou o artigo 311, do Código de Processo Penal.

Numa eventual discussão prática, questiona-se: qual lei o juiz irá aplicar ao caso concreto?

A grande diferença é a seguinte: O juiz deixará de aplicar a prisão preventiva de ofício (art. 311, do CPP) argumentando que o Pacote Anticrime revogou as regras de prisão preventiva de ofício do agressor ou; o juiz aplicará a prisão preventiva de ofício em face do agressor com base da Lei Maria da Pena? (art. 20, da Lei n. 11.340/06)

Antes mesmo de responder o referido questionamento acima apresentado, é necessário compreendermos que a prisão preventiva é uma medida assecuratória ou cautelar que pode ser decretada no curso da investigação preliminar ou do processo, inclusive após a sentença condenatória recorrível.

Atualmente, a prisão preventiva depende de requerimento do Ministério Público, do querelante, do assistente ou de representação do Delegado de Polícia. Com o advento do Pacote Anticrime, não houve nenhuma alteração legislativa em prisões decorrentes de violência doméstica.

Num primeiro momento, se colocarmos o art. 20 da Lei Maria da Penha a frente do artigo 311, do Código de Processo Penal, por entender que a incidência detém um significado presuntivo e ideológico ao proteger a mulher em si, conforme dispõe a norma material, poderia assim dizer que, se estará cumprida e superada a norma processual penal, cabendo a Lei Maria da Penha ser aplicada em sua integralidade em decorrência do princípio da especialidade.

Ao pensar desta forma, a incidência do principio da especialidade, certamente estabelecerá seus contornos práticos, ou seja, o juiz poderá decretar a prisão preventiva de ofício exclusivamente nos casos de violência doméstica, revogando tacitamente a norma processual penal (art. 311, CPP).

Em contrapartida, há argumentos para que o artigo 311 do CPP seja integralmente aplicado nos casos de violência doméstica, cabendo ao Poder Judiciário ser provocado por seus legitimados para que o juiz promova a prisão preventiva corretamente, inclusive a motivação das decisões do juiz devem ser apresentadas no momento que se segrega o acusado de violência doméstica.

É preciso salientar que, antes da alteração do artigo 311 do CPP, já havia inúmeras críticas quanto à mantença de prisão preventiva de ofício pelo juiz, pois seria incompatível por toda a sistemática, por violar ao princípio do contraditório e a ampla defesa, previstos constitucionalmente (art. , LV, CF/88), tanto é que, o legislador coube por suprimir o instituto da prisão preventiva ex oficio pelo magistrado como regra geral no Pacote Anticrime.

Assim, valendo-se dessa premissa, aplicação do regramento geral é mais cômodo, trazendo segurança jurídica para determinado caso concreto, de modo, ao afastar quanto a aplicação do artigo 20 da Lei Maria da Penha, mas não significa que a vítima ficará desamparada em determinado caso concreto, ao contrário, pois, ao ser provocado seja por parte do Ministério Público ou mesmo mediante representação do Delegado de Polícia, o juiz deverá trazer em sua decisão o motivo da prisão preventiva (art. 312 e seguintes do CPP) e desta forma, se reconhecerá por revogação tácita do que estabelece na Lei Maria da Penha.

Por derradeiro, sejam em casos de crimes de violência doméstica ou não, o Código de Processo Penal vigente estabelece que a prisão preventiva poderá ser decretada com base na garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que haja prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.” [1]

Sobre o tema, existem duas possíveis correntes:

1ª Rogério Sanches Cunha prevalece o artigo 311 CPP (sistema acusatório)

2ª Princípio da Especialidade – A Lei Maria da Penha seria lei especial (artigo 12 do CP) “Art. 12 – As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso”

Rogério Sanches diz que prevalecerá o artigo 311 do CPP, mas, há também uma segunda linha de pensamento, em que se fala sobre o princípio da especialidade (a lei maria da penha é uma lei especial se comparada ao 311 do CPP).

O raciocínio do Rogério Sanches é bastante razoável, visto que antes, o legislador  permitia que o juiz somente decretasse a prisão, na fase judicial. Agora, o legislador dá “um passo maior” e diz não caber a decretação da prisão em momento algum (a lei maria da penha possibilita o decreto de ofício nas duas fases, o que, para muitos, gera a relativização do sistema acusatório).

Mesmo na vigência do antigo artigo 311 do CPP, a doutrina já divergia quanto à possibilidade de decreto de prisão preventiva em sede inquisitorial de violência doméstica. Agora, com mais razão ainda, não é possível tratar o artigo 20 da lei maria da penha como uma exceção, mas sim, como contrariedade ao disposto em uma norma geral, prevista no artigo 311 do CPP. Logo, concordamos com Sanches ao indicar a prevalência do artigo 311 do CPP.


[1] PEREIRA, Luiz Fernando. O juiz pode decretar prisão preventiva de ofício em casos de violência doméstica com o advento do Pacote Anticrime? Publicado em: 05/2020. JusBrasil. Disponível em: <https://drluizfernandopereira.jusbrasil.com.br/artigos/859476317/o-juiz-pode-decretar-prisao-preventiva-de-oficio-em-casos-de-violencia-domestica-com-o-advento-do-pacote-anticrime#:~:text=Primeiro%2C%20diz%20respeito%20ao%20artigo,Maria%20da%20Penha%20(Lei%20n.&text=O%20Segundo%20diploma%20processual%20est%C3%A1,do%20C%C3%B3digo%20de%20Processo%20Penal.> Acesso em: 26/01/2021.

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